O perigo da normalidade
Por Lisandro Frederico
Ao poucos, os alunos da Escola Estadual Professor Raul Brasil e toda a cidade de Suzano tentam voltar à normalidade. Ou, algo próximo disso. Tudo ainda é muito dolorido. E até mesmo esta busca pela normalidade é um verdadeiro paradoxo. Afinal, ao atingir o status de normalidade, voltaremos a vivenciar os mesmos sistemas educacional e social que provocaram tamanha tragédia. Então, quem pode garantir que voltar ao normal é seguro?
Em meio ao massacre, voltamos a lembrar que os problemas da educação brasileira vão muito além das discussões de ideologia de gênero, da escola sem partido e da militarização do ensino.
É necessário enfrentar a dor e o medo que ainda nos assolam e dar adeus a busca pela normalidade. Temos que dar início a um novo normal. Um novo momento em que a educação passe a ser a chave para que a nossa sociedade saia do extremismo e da barbárie. As mortes daquele 13 de março jamais poderão ser esquecidas, mas nossos principais esforços devem estar direcionados aqueles que ficaram. Que sobreviveram.
Nossas escolas precisam ser, verdadeiramente, um palco de transformação, de desenvolvimento e da preparação de gerações futuras, que não se informem por meio de memes de Internet. A Raul Brasil deixa um legado e um aprendizado. Se o normal de antes do massacre voltar, novos ataques fatalmente irão ocorrer.
O aumento da segurança nos prédios educacionais tão citado de uns tempos para cá é uma mera vacina para a doença causada pelo vírus gerado a partir de uma educação deficitária. Devemos parar de exigir o retorno a uma normalidade que se configura por salas superlotadas, prédios com infraestrutura precária, professores sobrecarregados e com baixas remunerações e planos pedagógicos obsoletos.
Passou da hora de nos unirmos em busca de uma escola que efetivamente ensine, e deixe de ser um local de depósito de crianças e adolescentes.
Os Conselhos Tutelares e os profissionais de Psicologia precisam ser parte integrante desta nova rede de educação. Os jovens recebem diariamente uma carga de informação gigantesca. Muitos, precisam de ajuda para filtrar tamanho (des)conhecimento. A família deveria fazer este filtro, mas não tem feito. Assim, é, novamente, o sistema educacional quem exerce mais esta função.
Sempre quando ocorre uma tragédia, medidas são propostas. São debatidas. Teses mirabolantes e outras mais realistas surgem. No caso da Raul Brasil não foi diferente. Aparelhos detectores de metais nas portas das escolas, militarização do ensino e até professores armados. Somos, definitivamente e infelizmente, um País reativo.
Uma reatividade que se mostra em palavras, mas com poucos atos. Um mês depois do ataque, a Raul Brasil e tantas outras escolas seguem com um sistema falho na proteção dos nossos jovens. Os alunos/sobreviventes e as famílias ainda sofrem com a falta de apoio e de acolhimento.
Precisamos nos apresar, porque a normalidade parece mesmo estar voltando.
Comments